Foto: Getty Images / BBC News Brasil

De janeiro a julho de 2025, número de passageiros no aeroporto internacional do Rio de Janeiro cresceu 49,2% — bem acima do percentual nacional.

O Aeroporto Internacional Tom Jobim, o Galeão, que por anos conviveu com terminais vazios no Rio de Janeiro (RJ), hoje é o que mais cresce no Brasil.

De janeiro a julho de 2025, o terminal recebeu 9,7 milhões de passageiros, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) — 3,2 milhões a mais que no mesmo intervalo do ano passado, um avanço de 49,2%.

Mantido o ritmo, deve superar os 14 milhões de passageiros registrados em 2024, quando bateu seu recorde de voos internacionais e ultrapassou os níveis pré-pandemia.

No mês passado (25/09), o Galeão entrou em uma nova fase com a assinatura de um termo aditivo entre o governo federal, a Prefeitura do Rio e a concessionária RIOgaleão.

A iniciativa busca modernizar a gestão do terminal, garantir serviços de alto padrão e preparar o aeroporto para um leilão competitivo, previsto até 31 de março de 2026, com lance mínimo de R$ 932 milhões. A atual concessionária poderá disputar, mas sem direito de preferência.

O desempenho recente consolidou o Galeão como o terceiro maior aeroporto do país, atrás apenas de Guarulhos (26,2 milhões de passageiros até julho, aumento de 8,3%) e Congonhas (14,6 milhões, alta de 14,1%), ambos em São Paulo.

No país, os aeroportos brasileiros transportaram 73,4 milhões de passageiros até julho, um aumento de 9,6% em relação ao mesmo período de 2024.

Considerando apenas o número de voos, o Galeão é o sexto maior aeroporto — isso porque o aeroporto internacional carioca costuma receber, na média, mais aeronaves maiores.

Esse salto parecia improvável há poucos anos, já que o aeroporto era considerado um “elefante branco” — sem movimento suficiente para justificar o investimento que recebia.

Então, o que aconteceu?

Crise e ‘volta por cima’
Apesar da estrutura moderna, o aeroporto internacional carioca não atraía a quantidade de passageiros esperada.

O aeroporto doméstico Santos Dumont, mais próximo ao Centro do que o Galeão, consolidou-se como a principal porta de entrada do Rio.

Em 2016, o terminal 1 do aeroporto internacional chegou a ser desativado.

A crise foi tão grave que, em 2022, a RIOgaleão solicitou a devolução da concessão — sob sua administração desde 2013.

O Tribunal de Contas da União (TCU) autorizou a relicitação, mas o governo do então presidente Jair Bolsonaro optou por renegociar o contrato e manter a empresa à frente do aeroporto.

No ano seguinte, já sob o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o Ministério de Portos e Aeroportos anunciou a limitação de passageiros no Santos Dumont — tendo como consequência o redirecionamento de voos para o Galeão.

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A partir de outubro de 2023, foi aplicado um teto para o número máximo de passageiros que o Santos Dumonta poderia receber: 10 milhões. Em janeiro de 2024, o teto foi ajustado para 6,5 milhões ao ano.

A medida foi articulada com a Prefeitura do Rio, o governo estadual, a Anac e representantes do setor aéreo, com o objetivo de redirecionar parte da demanda para o Galeão e recuperar sua centralidade no sistema aeroportuário da região metropolitana.

Entre janeiro e julho de 2024, o Santos Dumont recebeu 3,3 milhões de passageiros. Neste mesmo período de 2025, o terminal registrou 3,4 milhões, um ligeiro aumento de 3% em relação ao ano anterior.

Em nota à BBC, o Ministério de Portos e Aeroportos afirmou que a ação “condicionou o mercado a utilizar o hub [centro de conexões] de maior capacidade física e slots [vagas para pousos e decolagens] disponíveis, revitalizando rapidamente o fluxo de passageiros no Galeão sem provocar queda no movimento agregado da região metropolitana”.

“A medida preservou a oferta de voos no Rio de Janeiro”, acrescentou o ministério.

Segundo a RIOgaleão, o aeroporto oferece voos para 26 destinos domésticos e 27 internacionais, com possibilidade de alcançar mil destinos no exterior com somente uma conexão.

O terminal 1 é usado como sala de embarque e desembarque doméstico “em linha com a demanda”, de acordo com a concessionária, além de abrigar serviços como a emissão de passaportes pela Polícia Federal, uma delegacia da Polícia Civil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), um hotel e o Centro de Operações do RIOgaleão.

Já o terminal 2 concentra o serviço de check-in e acesso à área restrita, tanto para voos domésticos quanto internacionais.

A Gol registrou um aumento de 32% nas decolagens no Galeão no primeiro semestre de 2025, em comparação com o mesmo período de 2024.

A Azul transportou 6% mais passageiros entre janeiro e julho, com cerca de 910 mil clientes passando pelo terminal carioca, contabilizando chegadas e partidas.

Já a Latam, maior companhia aérea do país segundo a Anac, transportou mais de 1,6 milhão de passageiros no Galeão no primeiro semestre de 2025, o que representa um crescimento de 17% em relação ao mesmo período do ano passado.

Para Renan Melo, advogado e especialista em aviação, os resultados positivos do Galeão se devem a um esforço coordenado entre governo e iniciativa privada, que tornou viável a retomada de investimentos no terminal.

Ele cita que a manutenção, sem reajuste, das tarifas e dos custos operacionais ajudou a atrair companhias aéreas para o Galeão.

Mas segundo Jeanine Pires, conselheira da Presidência da República e ex-presidente da Embratur, não é só o redirecionamento de voos do Santos Dumont que explica o sucesso recente do Galeão.

“O aumento do fluxo de turistas internacionais, favorecido pelo câmbio, e a retomada da economia e da demanda nacional também influenciam”, aponta Pires.

Melo lembra que a nova estrutura da concessão prevê planos de investimento até 2038, com melhorias, modernizações e ampliação da infraestrutura do aeroporto.

Entretanto, o especialista reconhece que a liberdade de escolha dos passageiros e das companhias aéreas foi diminuída, fazendo com que o Santos Dumont perdesse competitividade e o “cardápio” de destinos.

Hoje, a ponte aérea entre Rio e São Paulo é a principal operação do aeroporto doméstico.

A experiência do passageiro
A centralização de voos no Galeão alterou a rotina de passageiros que antes utilizavam o Santos Dumont.

Júlia Giordani Vasconcelos, contadora de 33 anos e moradora do bairro de Botafogo, viaja frequentemente a São Paulo a trabalho e ao Recife, sua cidade natal.

Ela costumava usar o Santos Dumont, mas após a mudança, teve dificuldade de encontrar voos ali, principalmente para Recife. A contadora também diz que os preços no aeroporto doméstico ficaram mais caros.

Outra dificuldade que ela aponta é o deslocamento para o Galeão, mais distante para ela do que o Santos Dumont.

A Prefeitura do Rio argumenta ter facilitado o acesso ao aeroporto internacional com a inauguração do Terminal Intermodal Gentileza, a abertura do corredor BRT Transbrasil e a implantação de uma faixa exclusiva para quem acessa o aeroporto pela Linha Vermelha (via que leva ao Galeão).

O Terminal Gentileza, no Centro, faz a integração entre o VLT (veículo leve sobre trilhos), BRT (sistema de ônibus de alta capacidade, com corredores exclusivos) e ônibus municipais.

Entre os serviços em operação está o expresso Gentileza-Galeão, um ônibus executivo que circula diariamente das 6h à meia-noite, com tarifa de R$ 15 e tempo médio de viagem de 20 a 25 minutos.

Já a faixa exclusiva na Linha Vermelha tem 2,2 km é fiscalizada eletronicamente, com o objetivo de monitorar que os veículos a utilizando de fato terão como destino o Galeão ou a Ilha do Governador, região do Rio também contemplada com o benefício.

Mas Júlia nunca considerou usar transporte público, como o BRT, por receios com a segurança no caminho.

“Eu não tenho nenhuma pretensão de usar e nunca usei. Acho perigoso, principalmente com mala, mochila, computador e itens de valor. De modo geral, não me sinto segura. Tenho medo. Acho que, apesar de poder ser uma boa ideia, eu realmente não consigo usar. Prefiro pegar táxi ou Uber, mesmo que isso pese no meu bolso”, explica.

“Da minha casa para o Galeão hoje em dia depende do trânsito, aproximadamente 40, 45 minutos, mas dependendo do horário, pode chegar até uma hora.”

Ainda assim, ela se sente insegura ao passar pela Linha Vermelha — via com histórico de assaltos e tiroteios, entre outros problemas de segurança.

“Não me sinto confortável todas as vezes que preciso viajar pelo Galeão, porque aquela Linha Vermelha não passa segurança alguma. Já vi situações de fechamento de rua, protestos… Para mim, ficou muito mais inseguro e desgastante.”

Apesar das críticas, Júlia reconhece melhorias no terminal: “O aeroporto é maior, tem menos filas e é mais organizado. Mas eu gostaria de poder escolher. Se pudesse, voaria sempre do Santos Dumont.”

Em nota, o governo estadual do Rio, responsável pela segurança pública, afirmou que a Polícia Militar, através do 17º BPM e do Batalhão de Policiamento em Vias Expressas, faz o patrulhamento diário da Linha Vermelha.

“Além disso, o Programa Estadual de Integração na Segurança (PROEIS), em convênio com a concessionária do aeroporto, mantém efetivo ininterrupto de 20 praças e 2 oficiais em sistema de revezamento, com atuação 24 horas por dia, tanto nas áreas internas (saguão, embarque e desembarque) quanto no entorno do terminal (trânsito, estacionamento e vias de acesso)”, acrescentou o governo fluminense.

“Em complemento, a base da Operação Segurança Presente do Galeão, inaugurada em julho de 2024, já realizou mais de 73 mil abordagens, registrando 101 ocorrências policiais e resultando em 40 prisões, sendo 25 de foragidos da Justiça.”

Um futuro ainda em disputa
Em cerimônia de assinatura de um termo aditivo no último dia 25, o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, disse que o Galeão pode se consolidar como hub de aviação na América do Sul.

O prefeito Eduardo Paes destacou que o terminal é essencial para o turismo do Rio e que uma gestão mais sólida pode até fazê-lo superar Guarulhos no fluxo de passageiros internacionais.

Jeanine Pires concorda: para ela, o Galeão ainda tem capacidade de sobra e pode absorver rotas que São Paulo já não comporta.

Entretanto, ainda há desafios pela frente.

“A aviação brasileira é volátil. O Galeão tem capacidade para crescer muito mais, mas precisa de estabilidade. Senão, corre o risco de repetir a montanha-russa do passado”, avalia Pires.

Ela lembra que fatores externos podem frear o ritmo: “O cenário é bastante incerto e suscetível a questões como os custos de combustível, oscilações internacionais e reformas tributárias.”

Os entrevistados citam ainda desafios locais que precisam ser melhorados, como segurança, transporte para acessar o aeroporto e conforto dentro e fora do terminal.

Eles também ressaltam que a sustentabilidade do terminal depende do fluxo doméstico, que mantém a operação estável diante da sazonalidade dos voos internacionais.

Mas Pires diz que o aumento de rotas internacionais também é desejável, desconcentrando o fluxo de Guarulhos e Brasília, por exemplo.

“Receber mais rotas, sobretudo internacionais, é excelente para o turismo internacional”, observa.

Fonte: BBCnews

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